quinta-feira, 28 de março de 2013

Apaixonados



Um dia quando menos esperarmos.
A primavera florescerá em nosso jardim,
E depois de algumas estações ignorando,
Finalmente perceberemos a beleza das flores.

E neste dia,
Correremos contra ao vento,
Embalados por canções melosas,
Que falam de diferentes histórias,
Como uma trilha sonora de nossos momentos.

São novos tempo,
De um mesmo tempo,
Para um novo jeito de “ser”.
Transformações tão grandes,
Que são impossíveis de esconder.

E antes que as flores se desmanchem no velho jardim,
Antes mesmo que as canções percam seus sentidos,
Acharemos o jeito certo de se encarar o vento,
E entenderemos que muitas das grandes transformações que vivemos,
Resumem-se em um novo amor.

(Apaixonados – Leonardo Kifer)

quarta-feira, 13 de março de 2013

Pedras e Janelas

Corre menino, vá depressa e não se deixe ser pego.
Vá pra longe, para bem distante.
Até onde suas pernas conseguirem correr.

Quando já estiver longe,
Ao sentir-se seguro,
Arrume um abrigo,
Talvez você precise descansar.

Não chore,
O que fazemos por amor,
Jamais será considerado erro.

Todos sabemos que o coração é capaz de iludir,
De nos colocar uma pedra em nossas mãos,
Apenas pelo prazer de nos fazer atirá-la,
E depois de feito o arremesso,
Descobrir que foi o alvo errado.

Mas acalme-se,
Foi um susto,
Ninguém há de te castigar.

Com o tempo,
Verás que novos vidros serão quebrados em vão,
E tudo em nome do amor,
Ou da insistente vontade de acertar.

E no momento certo,
A pedra terá um novo peso,
A janela uma nova textura,
E desta vez, não existirão estilhaços.

Por que ao acertar o alvo,
O vidro não se partirá,
A pedra então se desmanchará em pétalas,
E tudo será transformado em um sentimento continuo,
De amar e amar...

(Pedras e Janelas – Leonardo Kifer)

segunda-feira, 11 de março de 2013

Héróis caninos...

Ainda ontem, lembro-me de pedalar pelo bairro com minha velha bicicleta, na companhia de meus dois cachorros. Eu seguia em frente, traçando um caminho sem medo, rumo ao desconhecido, enquanto meus dois amigos caninos corriam atrás, livres e felizes por não haver coleiras e correntes que os mantivessem presos.
À medida que o tempo foi passando, meus companheiros de aventura já eram capazes de escolher o caminho que queria que os seguissem, uma vez que eles já não eram mais os filhotes que corriam atrás de seu dono, eram adultos e eu corria para que eles não se esquecessem de voltar para casa...  Eram novos tempos, eu não precisava mais protegê-los, eles agora eram meus cães de guarda e ninguém era capaz de levantar a mão para mim sem que eles voassem em cima do possível agressor. Eu era um menino seguro, em um mundo que começava a apresentar perigo.
Com o passar dos anos, fui deixando de ser um menino para já me transformar em um homem, afinal eu já tinha 18 anos, havia terminado o ensino médio e muito em breve estaria na faculdade. Cães de guarda? Para quê? Eu era um herói! Meu próprio herói e nada e nem ninguém poderia me derrotar... Não! Eu era forte e esperto o suficiente para enfrentar as maldades do mundo. O assalto do ano anterior em que perdi R$10? Eu tinha 17 anos, agora era bem mais velho. 18 anos, maior de idade, entende?
Com 19 anos, eu já estava trabalhando, e sentia-me cada vez mais “senhor de mim”... Um dia, ao retornar do trabalho, encontro meu pai triste, estava sentado à sala de cabeça baixa. Ao questioná-lo sobre o porquê de tamanha tristeza, descubro que os meus antigos heróis haviam sido dados para dois ex-vizinhos que haviam se mudado para um sítio, no interior da cidade. Meu mundo desabou junto à tristeza de meu pai, como podia ele ter dado os meus cachorros? Quem passaria a proteger nossas casas? Por que ninguém perguntou antes se eu queria que fizessem isso? A justificativa que ouvi, foi que está era a única forma dos cachorros que sempre foram livres, continuarem a correr por aí... O trabalho e a vida agitada que minha nova idade havia me proporcionado, tirou de mim o tempo que eu tinha para eu correr juntos os cachorros.
E assim os dias foram se passando, eu agora tinha que conviver com as lembranças de meus antigos filhotes, meus amigos brincalhões e entender que meus pais haviam tomado a melhor das decisões... Os cachorros mereciam a liberdade que eu não podia dá-los, e mesmo se eu quisesse o bairro já começa a ter um maior fluxo de carros. E cães, eram somente para proteger a todos da violência, a cidade já não era mais tão segura assim...
Um mês após os cachorros irem para o sitio, descubro que nosso ex-vizinho em um acesso de raiva, matou nossos cachorros dois dias depois de os levarem... A Ully, como era chamada a cadela, morreu com uma pazada na cabeça e o Thor, nosso bobalhão, foi morto enforcado minutos depois. Ele os matou porque a Ully avançou em seu amigo e o mordeu, após tentar defender seu novo dono do que ela julgou ser um ataque, visto que o tal amigo o derrubou no chão durante uma brincadeira de luta. A notícia veio como tiro no peito, eu perdia não só dois cachorros protetores, mas sim, dois amigos fiéis que eram capazes de tudo para tentar me proteger... Choremos junto, meu pai, minha mãe e eu, não sabíamos definir se era a dor da perda ou o remorso de tê-los dado, eu estava sentindo-me fraco e agora não me sentia mais um herói, estava em mundo completamente diferente daquele que me permitia andar livre aos dez anos, só na companhia de filhotes... eu já não tinha mais certeza de nada.
E pouco a pouco as transformações foram acontecendo, à medida em que eu amadurecia o mundo parecia retroceder, ao meu redor, pessoas matando umas as outras, assaltos a cada esquina, nada mais era seguro, nada mais seria seguro... Eram tempos modernos.
Hoje tenho 29 anos, e olho para trás com um saudosismo imenso, vejo os novos meninos com seus filhotes presos em coleiras dentro do carro de seus pais, não existem mais as brincadeiras de rua, é a era da internet, ninguém mais precisa se relacionar entre si, a menos que seja para fazer novos filhos... Brincar com o cachorro? Espera aí, quando entrar em casa precisa usar aquele sabonete antibactericida, se possível passe álcool gel após o banho... Está tudo tão mudado, tão diferente do que conheci, não existem mais cor, nada mais é colorido, é nude, é clean.
Eu já não tenho mais amigos pretos, nem negros, e confesso ter medo de perder também os afrodescendentes... Os amigos gays, que antes eram xingados dia após dias, continuam sendo xingados, agora por uma parcela menor de pessoas (vale dizer que muitos que antes os ofendiam, hoje estão casados com outros do mesmo sexo e felizes. Existem também aqueles que passaram aceitar, desde que não sejam com seus filhos), hoje a briga maior dos homossexuais (eles também mudaram de nome na tentativa de uma melhor aceitação) é com a Igreja. Sim! A Igreja diz que isso vai contra o principio de Deus, ainda que Deus tenha dito que somos todos seus filhos e iguais! Mas parece-me que isso não agrada alguns padres, pastores e outros membros administrativos das casas do Senhor. Talvez esses assuntos consigam esconder um pouco mais o fato de Deus ter virado a marca que mais cresce e da lucro no mundo todo, pode ser que a Microsoft crie algum softwear divino...
Mas a maior de todas as mudanças e a que mais agride a mim e castiga nosso país, é como nós nos tornamos automutiladores e sem nenhum pudor elegemos políticos que nos roubam, nos julgam e alguns ainda são capazes de usarem o nome de Deus para nos catalogarem por nossas raças e opções sexuais, o mesmo que Hitler um dia fez no passado... Saudades do tempo em que pintávamos os nossos rostos e íamos as ruas protestar e revindicar por nossos direitos, saudades do tempo em se ter realmente direitos!
Imagino que talvez eu possa fazer minha parte, me reinventar como herói, adotar dois novos filhotes e ensiná-los a serem livres, e quando forem adultos soltá-los ao mundo e não segui-los, assim poderiam lutar não só por mim, mas por todos nós!

(O passeio por um país – Leonardo Kifer)