segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O importante da vida...

A minha vida inteira desejei encontrar uma pessoa linda, e ser feliz ao seu lado. A minha vida inteira se foi, e hoje estou prestes a completar noventa e três anos, muita idade para que sempre viveu só, a espera da pessoa perfeita, que jamais se apresentou a mim.

Quando eu tinha treze anos me apaixonei pela primeira vez, era tudo tão infantil que eu podia jurar estar em um mundo de mágica. Nunca tive a oportunidade de trocar uma palavra uma palavra com a senhorita Iara, cinco anos mais velha do que eu, e que se casara e partira para morar em Santos com o seu esposo, quinze anos mais velho do que ela.
Depois da frustração do meu primeiro amor, prometi a mim mesmo que me casaria com a mulher mais perfeita de todo o Estado da Guanabara, como era então chamado o Estado do Rio de Janeiro. Mas a promessa me custou muito, e logo após me formar em direito, rejeitei a idéia de minha mãe em me unir a Ezilda Latzer de Alcantra e Silva, filha única dos donos de uma rede de lojas da Zona Sul carioca, e que eu tinha um “namorico” de três anos. Minha mãe cedia aos apenas da Sra. Latzer, uma polonesa cheia de tradições que para mim não passavam de idiotices. Eu e Ezilda rompemos relação logo após eu dizer que não me casaria, e nunca mais voltou a me procurar. Anos depois soube que ela se casara com um jovem empresário que acabara de herdar um jornal de seu pai.

E assim, driblando as possibilidades de casamentos que surgia à medida que eu me relacionava com alguma jovem donzela enquanto esperava a mulher perfeita que vi minha juventude ir embora e me peguei sozinho sentado em uma mesa de escritório aos sessenta e sete anos. Eu perdera meus pais ainda novo, aos vinte e nove anos, e meu irmão que havia escolhido o celibato, morreu após adquirir varíola. Eu não tinha ninguém próximo que pudesse chamar de família, o mais perto disso eram os netos de um primo de terceiro grau que morava em São José dos Campos e que eu só havia ouvida falar quando minha mãe soube de seus nascimentos.

Nesta noite voltei para casa, uma enorme mansão no Leblon, e arrasado tentei dar cabo de minha vida, e terminar ali aquele enorme sofrimento... Mas fui covarde e graças à Deus a covardia me permitiu ir além e tentar recuperar o tempo perdido.

Eu já era um homem rico, a advocacia me rendera uma ótima condição financeira e podia me aposentar, e assim fiz, entreguei meu escritório na mão de meus sócios e iniciei uma série de viagens na tentativa de encontrar um amor.

Não vou negar que surgiram muitas mulheres neste meio tempo, afinal o dinheiro desperta interesse, mais nenhuma delas conseguiu realmente me conquistar, e a elas eu somente proporcionei mimos, em sinal de agradecimento aos prazeres recebidos na cama.

E por mais vinte e cinco anos busquei alguém para me casar, e vi a vitalidade se perder pelas fibras já fracas e quase sem vida de meu corpo, e um enorme vazio se formar e refletirem por entre meus olhos azuis. Foi quando desisti e me entreguei à única que parecia me aceitar em seus braços e esperei lentamente vir me buscar, mas nem a morte me aceitou. Eu buscava no espelho a beleza que um dia foi em mim tão predominante, e só encontrava resquícios do que fui.

E de volta a minha solitária casa, com muitos quartos e nenhuma companhia além das dos empregados, resolvi viver o restante de vida que ainda tinha em paz, e esquecer para sempre a vontade de viver um amor. E foi justamente nesse momento em que finalmente me apaixonei, não um amor infantil como tive ao meus treze anos, e sim um maduro, capaz de me dar o vigor que a idade levou consigo.

Ela era Julia, uma jovem e atraente enfermeira, que viera trabalhar comigo a fim de me ajudar a me locomover no dia-dia, insistência dos meus poucos amigos que ainda estavam vivos.

Julia tinha uma alegria que jamais vi em nenhuma mulher, era muito pobre, mas nunca se queixa de sua pouca condição. Muito atenciosa acompanhava todos os meus passos, e sempre que eu a olhava ela me retribuía o olhar com um sorriso acanhado.

Da angústia de não amar, surgiu o desespero de precisar correr contra o tempo, e me declarar à mulher que eu amo, sem parecer ridículo por conta de toda a diferença de idade.

Comecei a comprar mimos, mais Julia se negava a recebê-los, dizia que não era certo, que estava ali para cuidar de mim e não se presenteada. Tudo que eu fazia parecia não agradá-la, pois rejeitava qualquer gesto de aproximação.

Eu precisava me declarar, não tinha mais tempo, o relógio me avisava constantemente que meu tempo era escasso, e eu consciente disso decidi contar tudo a Julia, e mesmo correndo o risco de ouvi-la rir da mim, eu fiz... Contei a Julia tudo o que sentia por ela, e ela não disse nada, apenas beijou uma de minhas mãos e saiu. No outro dia veio a mim e pediu para ser dispensada de suas funções, e a questionei o porquê de tal atitude e ela me contou o que eu mais temia, que amava outro homem, e que estava com data marcada para se casar. Eu pedi a Julia que não deixasse seu emprego, e prometi que jamais tocaria no assunto novamente com ela, e ela com muito custo aceitou ficar. Com o tempo fui passando a ter por Julia um sentimento de Pai e filha, e a convidei para morar aqui com seu esposo.

E apesar de não ter encontrado o grande amor de minha vida, fico satisfeito por ter me permitido corrigir um enorme erro que levei por quase toda minha vida, de querer dar ao amor uma forma física perfeita, e não olhá-lo com olhos que só procuram a beleza ao invés do sincero sorriso que desperta o verdadeiro amor. Hoje, me sinto feliz, completo, Julia está grávida e eu serei avô.

(Sempre existe tempo para amar - Leonardo Kifer)

Nenhum comentário:

Postar um comentário